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Posted by Edgar on

Deixou cair sobre a cama mais que o próprio peso. Olhou para o teto por alguns segundos, pensando em quem teria escolhido aquela maldita luminária. Fechou os olhos, fechou-se ao mundo. Mergulhou nas entranhas do seu próprio pensamento, buscando no cotidiano dos documentos, das assinaturas, dos toques de telefone, do cheiro de café, alguma justificativa para aquele peso extra que fazia ranger, a cada meneio, as molas do velho colchão. Tentou ficar imóvel. Buscou o silêncio. Buscou o sentido daquele zumbido que lhe atormentava os ouvidos, um zumbido que só se fazia ouvir no interior de sua angústia. Maldita luminária, pensou novamente. Os dedos dos pés latejavam dentro do sapato. Sentia um misto de formigamento, calor e dor que brotava-lhe dos pés e fazia sentir-se por toda a musculatura até alcançar o fundo dos olhos… deixou os pés escorregarem para fora dos sapatos, afrouxou a gravata, buscou o interruptor sem sucesso. Corpo e mente, dormentes, desligaram-se. Apenas a luminária permaneceu acesa, a única testemunha de uma morte lenta e cadenciada. Morria em doses homeopáticas. Morria um pouco a cada noite. A luz que se projetava feria-lhe a vista. Aos poucos seus nervos óticos se ajustaram à luminosidade do novo dia, da velha luminária. Apertou o nó da gravata enquanto se preparava mais um dia. Preparava-se para morrer mais um pouco da sua morte. Lenta. Cadenciada. Ao sair, ainda com a mão sobre o interruptor, pensou, maldita luminária. *clique*